05 • a escrita de camila sosa villada
ou uma declaração de amor para uma das minhas escritoras favoritas
“Nada aqui é tranquilo. Tudo está vivo, tudo arranha, morde ou envenena. É preciso escrever, é necessário escrever, agora, no fim do mundo” - a viagem inútil
já faz algum tempo que tenho tentado escrever sobre camila e sobre como a sua escrita me atravessa. tentado colocar em palavras o que me levou a querer ler tudo o que ela escreve.
acho que começa com a rebeldia. camila não faz questão, no texto ou fora dele, de performar o modelo higiênico da vida burguesa. ela não escreve para te deixar confortável. muito pelo contrário, ela escreve para virar o mundo que a gente teima em ter como norma de cabeça para baixo. e faz isso com muita honestidade, sem firulas ou edições. ela não poupa quem lê.
depois tem a sobrevivência a certos tipos de tristeza. em especial, a tristeza carregada por quem cresceu pobre na américa latina. para além das questões de gênero e sexualidade, suas histórias escancaram como as questões de classe moldam a vida das personagens, muitas vezes transformando tudo em um grande todos contra todos.
e também porque ela nos ajuda a lembrar que “nem tudo é morte e estátuas de sal. que há desejos e corações que brilham no escuro”.
(confesso que também pode ser pela nerdice compartilhada, por vivermos chapadas, pelas piadas ruins e pela obsessão por pedro pascoal)
"Escrever implica uma rebeldia, porque envolve reflexão. E a reflexão é inadmissível em tempos de produção" - a viagem inútil
—
camila tem o dom de deixar as histórias morando na nossa cabeça. sempre me pego lembrando de trechos de seus livros. gosto, em especial, de dois deles.
o parque das irmãs magníficas foi o meu primeiro contato com a sua escrita. amei a capa e amei ainda mais o livro. vi o reflexo de minha juventude conectado com a rebeldia desse grupo peculiar de travestis frequentadoras do parque sarmiento — tão semelhantes e distintas.
em tese sobre uma domesticação, camila escreve, de acordo com ela, uma “ficção científica travesti”. a história, que se passa em um futuro próximo, nos apresenta personagens sem nomes: a atriz, o marido, o filho. todos presos na performance plástica da vida da família tradicional latino-americana. camila diz que este é o seu melhor livro e eu não poderia concordar mais.
"Outra diz que bem tem a carinha de se chamar O Brilho dos Olhos. Outra a manda se calar por ser tão poética" - o parque das irmãs magníficas
—
gosto de compartilhar camila com pessoas queridas. dia desses presenteei uma amiga com o parque das irmãs magníficas. com outra amiga fui ver camila recitando trechos de tese sobre a domesticação. gosto quando se deparam com algo dela e me mandam. é bom ser lembrada por aquilo que importa.
em entrevista à revista 451, ela falou sobre a avalanche de amor que recebeu no brasil. por isso, quero encerrar o texto fazendo coro à intensidade de um país que ama demais e dizer: te amo, camila sosa villada!
—
extra: aguardando cenas dos próximos capítulos.
camila sosa villada nasceu na cidade de la falda, em córdoba, argentina, onde estudou comunicação social e teatro. como atriz, atuou em diversas produções audiovisuais no cinema e na televisão. como escritora, teve cinco livros traduzidos para o português e, com parque das irmãs magníficas, recebeu o prêmio sor juana inés de la cruz. (editora fósforo)
para além do livro:
bate papo com camila na megafauna
“acreditei escrever a partir do horror”, entrevista na tv cultura
participação da camila na feira do livro de 2024
participação da camila na flip de 2022
ótima entrevista com a tamy
“a vida da atriz" em tese sobre uma domesticação
transescrita, matéria de capa na 451
o perfil de camila no instagram é apenas perfeito
bloco de notas:
eu poderia falar sobre os seis longos meses que passei longe daqui? poderia. mas, influenciada por camila, tenho dado outro sentido a essa ausência. como ela diz:
“não lamento pelos períodos de não escrita, pelo contrário, eu os celebro como os espaços em branco da minha vida que não consigo explicar, como as coisas que ainda não têm suas palavras, como as emoções inexplicáveis”
até breve,
pri
também é minha favorita, minha obsessão, quem me tirou do buraco literário (e não só), de quem eu quero comer um pedaço e ser amiga, tudo junto, e com amor. ay!
PELO AMOR DE TIA ENCARNA ME BOTA NA LISTA DAS CAMISETAS